segunda-feira, 1 de abril de 2013

O sol é um só, mas quem sabe são duas manhãs

Pela manhã ambos escovamos os dentes: eu usei close up, ele sorriso.
Ambos tomamos café, mas antes do café eu tomei um banho; já ele... eu não garanto,
pois parece-me que estava com a mesma camisa da Cyclone de ontem.
Igor me deu um bom dia formidável, como de costume: "E aê, zé buceta! Tás bem?", e 
logo em seguida me deu um abraço adiantando que hoje ia ter prova, mas que depois
ele achava que iria ter futebol.

Sobre o futebol eu estava por fora, mas para a prova eu estava afiado: dessa vez minha
nota certamente seria maior do que a de Rodrigo, pensei.
Eu lamentava o fato de Igor não poder ir lá em casa jogar Play 2. Meus pais não gostavam.
Minha mãe sempre dizia que ele não era boa influência, e depois que achou uma Pure Hemp assinada por ele, que dizia: "aproveita, Zé", foi que passou a crer que era o demônio encarnado...

Igor era mesmo meio complicado: o pai vivia numa cachaça da desgraça, e a mãe, coitada, fazia arrumações mundo a fora pra sustentar eles e mais uma guria de 7 anos.
Igor adotou o nome de Mac e passou a levar umas paradas meio sinistras pra o futebol, e a galera logo passou a curtir de montão.
Eu tinha medo de andar com ele quando ele tava carregado. Mas fazer o quê?
Nunca tive um amigo como Igor, o Mac Ligeirinho da Zona Norte, como passou a ser conhecido.

Os anos se passaram e nós tivemos de nos mudar em virtude do mestrado de papai, e do meu curso de inglês.
Na festa de despedida Mac apareceu de surpresa no outro lado do nosso muro e me deu um toque:
"-Ooooi, Mac!"
"-Chega, aê, Zé Bê... Pelo menos um tchau, né vei?"

Dei um jeito e escapei, e lá estava ele, com cara de choro e um cheiro muito forte de álcool.
"-Toma. Leva essa pra dar sorte, e vê se não vacila desse vez!"
"-Aff, Igor. Deixa de viage. E teu curso de informática que tu ia fazer? Vamos diminuir essa birita, né meu chapa? Vai ficar de vacilação pra vida é?"
"-Tô juntando uma grana, meu vei... Vou estudar tanto que vou virar um hacker, você vai ver um dia, hahahaha. E que conversa de vacilação é essa? Eu sou esperto, meu cumpade. Você sabe disso. Eu nunca perdi o controle, como disse Mr. Kurt."

Depois de um abraço meu amigo sumiu tão "ligeiro" quanto seu pseudônimo...

Hoje, de férias e de volta ao lugar onde vivi tantos riscos com meu amigo maluco, fui à casa da avó e em seguida subi a ladeira da casa dele pra matar a saudade que já fazia 2 anos. Estava escuro como sempre, mas a galera já me conhecia. Ao chegar lá encontrei um barraco de portas caídas, com um ar de abandono.
Dona Argelina, vizinha de Mac, me disse que depois da tragédia a mãe dele e a irmã haviam ido pro Rio, provavelmente para casa de familiares.

Mac, meu amigo, foi "apagado" antes de terminar de juntar a grana para o curso de Hacker que ia fazer no Centro da Cidade.
Eu preferia nunca ter voltado pra esse lugar. Na verdade, eu nunca deveria ter vindo.


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